domingo, 18 de outubro de 2009

O que falhou no PSD?


Depois de um ciclo eleitoral em que - muitos se parecem esquecer - o PSD venceu 2 das 3 eleições que se realizaram: europeias e autárquicas (tendo apenas perdido as legislativas), é chegado o momento de nos sentarmos todos (sobretudo os que, como eu, são "laranjas") e de reflectirmos no que aconteceu e como se poderá evitar erros semelhantes no futuro:
  1. A eleição de Manuela Ferreira Leite representou uma mudança de paradigma nas últimas lideranças políticas do PSD - um perfil mais austero, mais prudente, menos efusivo e, sobretudo, com menor "verbo" e menos capacidade empática (o que se traduz, inevitavelmente, em menos "carisma" - algum deste, diga-se, tem sido cada vez mais insuflado e fabricado pelos "fazedores de opinião" e pela imprensa ...)

  2. Esta liderança afirmou, desde cedo, que o seu lema e o seu grande projecto político seriam a reabilitação do país através da confiança na verdade e na transparência como formas de acção: a política de verdade. Desta forma, assumindo compromissos e não fazendo promessas, estabelecer-se-ia uma relação de confiança com o eleitorado e restaurar-se-ia algum do prestígio perdido das instituições.

  3. Por outro lado, Manuela Ferreira Leite afirmou a sua vontade de não realizar comícios e grandes manifestações de "política-espectáculo", mantendo uma linha de coerência face à sua leitura da grave situação económica e social do país. Nesta mesma linha de acção política preferiu o contacto de proximidade com as populações e as empresas - o que se reflectiu, naturalmente, na sua campanha eleitoral.

Definidas as grandes linhas gerais, vejamos o que se passou no espaço de tempo entre Maio e Setembro de 2009:

  1. O PSD vence, de forma clara, as eleições europeias (em grande parte pela extraordinária força e capacidade de Paulo Rangel), deitando por terra a estratégia da "roubalheira" de Vital Moreira (que chamou à colação numas eleições europeias o caso BPN, colando-o ao PSD) e os ataques sucessivos da clique socretina. Também, internamante, Manuela Ferreira Leite vence a "sua" batalha: Paulo Rangel foi uma aposta pessoal da líder do PSD! Foi uma cartada alta, arriscada, já que Paulo Rangel vinha fazendo um extraordinário trabalho na Assembleia da República, enquanto líder parlamentar, mas - e bem - entendeu a Presidente do PSD que era necessário começar o ciclo com um "trunfo".

  2. Este triunfo garante a Manuela Ferreira Leite um grande balão de oxigénio, já que, como é consabido, a intriga e a guerrilha interna no PSD nos últimos anos tem sido, verdadeiramente, autofágica e em muito tem contribuído para o desgaste e a perda de eleitorado do Partido. Não nos esqueçamos que uma eventual derrota, mesmo que pequena, poderia ser logo sinal de "pedido de cabeça" e de novo ciclo de instabilidade, desviando-se o partido daquilo que deevrá ser essencial: o país.

  3. No caminho para as Legislativas, Manuela Ferreira Leite termina o Forum "Portugal de Verdade" (na minha opinião, um dos maiores contributos desta liderança para a afirmação de um projecto de governo alternativo e para a convocação de esforços e de vontades - nomeadamente independentes, onde destaco os fantásticos contributos de Belmiro de Azevedo, João César das Neves, Nuno Crato, Daniel Bessa, Maria José Nogueira Pinto e tantas outras figuras de primeiro plano). Para além disso, afirma a sua linha orientadora (até aqui coerente) e que parece estar a ser bem assimilada pelos portugueses (a tal ponto que as sondagens mostram uma tendência até ao final do verão: a proximidade "taco a taco" entre PSD e PS).

  4. Mês de Julho-Agosto. As listas de deputados são enviadas pelas Comissões Políticas Distritais (depois de terem sido aprovadas nos plenários das Assembleias Distritais) para a Comissão Política Nacional, que vai dar o seu parecer sobre as mesmas. Balanço: uma boa parte dos cabeças de lista propostos pelas distritais são substituídos por Manuela Ferreira Leite e pela sua equipa (ex: em Vila Real - Passos Coelho é preterido por Montalvão Machado; Faro - Mendes Bota é preterido por Jorge Bacelar Gouveia; em Santarém - Miguel Relvas é preterido por José Pacheco Pereira; em Bragança - Adão Bastos é preterido por José Ferreira Gomes, etc ...). Para além disso, a líder - pessoalmente - assume a escolha de António Preto e Helena Lopes da Costa, 2 deputados envolvidos em processos judiciais ainda não concluídos e em fase final. No caso de António Preto, a escolha é duplamente simbólica: trata-se de um aliado de longa data da agora Presidente do Partido, que contou com o seu apoio na eleição como Presidente da Distrital de Lisboa (e vice-versa) e que está envolvido no célebre "caso da mala" (infelizmente célebre) que está relacionado com a angariação de fundos na campanha eleitoral interna para a Distrital.

  5. Acresce que, por opção política também pessoal, Manuela Ferreira Leite optou por não incluír na lista o seu adversário nas eleições internas: Pedro Passos Coelho, bem como Miguel Relvas (um dos mais próximos apoiantes do primeiro). Esta opção acabou por ter como consequência uma lista menos ampla, menos representativa, mas que procurou ter uma bancada una em torno da direcção do Partido. Naturalmente que, por um lado, compreendo que Ferreira Leite quisesse (como toda a gente quer, é bom que se diga) uma bancada leal, mas é também verdade que o grupo parlamentar perdeu vozes que lhe poderiam dar, eventualmente, mais riqueza e diversidade.

Foi neste quadro que o PSD partiu para a campanha eleitoral para as eleições legislativas, sendo que se confrontava com as seguintes dificuldades:

  1. A "política de verdade" foi afectada pela escolha de António Preto e Lopes da Costa
  2. O Partido não encarou este combate unido, mas fragmentado nas "velhas" disputas internas (atiçadas pela não escolha de Passos Coelho e pela acusação de que estaria a avançar paar uma linha de facção - o que foi um risco desnecessário)
  3. Uma imprensa marcadamente hostil e que aproveitaria o primeiro sinal para "cilindrar" o partido, já de si um pouco fragilizado por declarações sucessivas na imprensa

A força comunicacional do Partido Socialista (que gasta milhares e milhares em "marketeers" e assessorias de imprensa) e a lógica vitimizadora de Sócrates (para não dizer mentirosa e baixa), aproveitando a seu favor as antigas - e sólidas - ligações entre Cavaco Silva e Manuela Ferreira Leite para "subentender" favorecimentos de Belém ao PSD ...

No final das eleições, porque perdeu o PSD?

  1. Porque na recta final, em primeira instância, não se mostrou mobilizado e unido para o grande combate (note-se que foi, praticamente, a JSD - onde me incluo, com muito gosto e em torno da qual participei neste grande combate - e o núcleo duro de Ferreira Leite - com o concurso de uma/outra "figura nacional" que estiveram ao lado de MFL)
  2. Porque a mensagem não passou e o projecto não pôde ser clara e correctamente apreendido pelas pessoas (presas nos "soundbites" socialistas - como as acusações de que MFL era "salazarista" ou o medo da perda de direitos, ou a privatização da segurança social, enfim ... valeu tudo no jogo sujo do PS!)
  3. Porque MLF foi posta em causa - numa altura em que o que mais importava era o país - pelos seus companheiros de partido (que não souberam por de lado velhas divergências pessoais em vez de reconhecerem o perfil e competência da candidata)
  4. Porque o "caso das Escutas" prejudicou objectivamente o PSD (sendo que foi um erro dedicar tempo de antena, durante a campanha a este tema, mordendo o "isco" da imprensa)
  5. Porque MFL foi educada e "limpa" nos debates (e os portugueses gostam de líderes autoritários, mandões, que imponham "respeitinho" - o português gosta de ser "mandado")

Por último julgo que os portugueses talvez não quisessem um Primeiro-Ministro rigoroso, exigente e, acima de tudo, responsável

A ver vamos qual o destino deste país e o seu futuro

4 comentários:

  1. "Por último julgo que os portugueses talvez não quisessem um Primeiro-Ministro rigoroso, exigente e, acima de tudo, responsável"

    Hm ... Bebe água que isso passa. Sabes que tal coisa não existe. Como também sabes das nossas discussões, caso ela fosse 1ª ministra só daria problemas. Porquê? Basta pensar ... Como um financeiro que só vê números.
    Mudar? Concordo. Mas para melhor, nunca para pior... O vosso problema foi que vocês nem são unidos quanto baste, nem sabem apresentar soluções válidas. Tão simples quanto isso.

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  2. Nas Europeias foi Rangel contra Vital e nas Autárquicas foram muitas eleições. O único momento em que Manuela Ferreira Leite foi a votos, segundo Mira Amaral, "conseguiu o milagre de perder as Legislativas". Faltou um Paulo Portas... :)

    Um abraço Gonçalo

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  3. Caro Adriano

    Fico feliz que a única parte do meu texto que te suscitou um comentário seja a última ...

    Ainda bem!

    (não me vou chater contigo - tenho demasiada consideração por ti para o fazer - por causa de uma personagem como o actual PM)

    Um abraço

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  4. Caro Paulo, boa tarde

    Obrigado pelo teu comentário!

    Faltou garra, faltou força, faltou esperança

    A competências estava lá, mas não basta

    Um abraço

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